segunda-feira, 28 de junho de 2010

True Blood


É a melhor série que eu já vi em 5 anos pós "Six Feet Under". Tão bem amarrada e tão rica em personagens que ninguém ali é figurante. Todo mundo tem uma função. Você pode preferir os personagens secundários, como eu, você pode discordar do mocinho e o ver sob o ponto de vista do vilão. Não existe aquela lineariedade moralizadora, porque a série existe pra criticar justamente isso: a idiotice conservadora. É mais que uma série de vampiros. É uma série que critica a sociedade, a política de minorias e sua eterna busca da especialidade a partir da exceção. Da religião como argumento massificador da intolerância.

E você pode achar que parece X-men. Parece mesmo, pegaram até a Vampira dos X-men, que, na série, não é uma deles. É um X-men pra adultos com senso crítico e de humor refinado. Parte do homem x Vampiros. Vivos x mortos. Estes lutando pela igualdade em direitos civis. Pela pacificação, enquanto os homens pelo extermínio. Os vampiros sugam o sangue dos humanos e os humanos dos vampiros. E você tem ainda os mênades, lobisomens, metamorfos,etc.

Cansados de se esconderem por milhares de anos, os vampiros resolveram aparecer, dois anos antes do início da série. Eles se alimentam de um sangue industrializado e não mais necessitam sugar sangue humano, tomam o mundo humano-centrado e lutam pela coexistência e igualdade em direitos. Autodeterminação. Vampiros são aqueles que perderam humanidade ,mas que não necessariamente significa barbárie. Eles podem ser civilizados e tolerantes, e podem exercer domínio e escravizar o humano. O que a série enfatiza é o vice-versa: a igualdade de fato de natureza e nocividade. Do que pode significar pra alguém viver em sociedade.  O referencial são os homens, não os vampiros.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Donnie Darko SPOILERS

Eu vi apenas o filme, não vi os comentários dos atores, diretor, etc. e vi no mesmo dia em que eu postei aqui. O problema de se lidar com filmes cults é ter que ir de encontro com o que os fãs pensam. Interpretação tem limites e eu não acho que o diretor do filme faria um comentário sobre o final do filme, entregando do que realmente se trata, ainda mais sabendo que os fãs criaram toda uma teoria sobre viagem no espaço, o que faz parecer genial, algo que, sinceramente, não acho que tenha sido a intenção do autor, mas criação de fãs.

Se você sustenta essa teoria de superpoderes premonitórios e de alterar o futuro, você ignora detalhes do filme e cria um monte de furos. Questionamentos que o filme, por si só, não responde. Não teria a menor relevância o Donnie ser esquizofrênico, não faria sentido ele morrer, já que ele morreria sozinho, sua namorada e a Samantha também, porque a diferença da história dos 28 dias é que o que ele mais temia, morrer sozinho, não ocorre com ninguém, nem com o Frank. Ele cria uma história que não tem nada a ver com o que acontece, porque ele não vê sentido na forma como as pessoas encaram a vida. Desde família, escola, busca por Deus, auto-ajuda, etc. E tudo isso é explicitamente criticado, não é subjetivo. 


A trilha sonora passa de forma videoclíptica, na quase integralidade e sempre alta. Porque a letra é importante. E as ações que o Frank o manda praticar são feitas de forma desmotivada. "THEY MADE ME DO IT" é o que ele escreve no pátio da escola. Por que "eles"? porque, por todo o filme, ele é acompanhado dos dois amigos imaginários que você vê no ponto de ônibus.Até na última cena, quando o Frank leva o tiro, eles estão lá. Eles sempre estão em segundo plano, um de cada lado e o Donnie no meio. O abafador de orelha que ele pega Cherita também tem um simbolismo. Ele diz a ela que as coisas iriam melhorar pra ela. Ele diz pra si próprio, porque ela é uma pessoa solitária, depressiva e sofre de bullying, como ele também. O abafador é pra não ouvir as vozes imaginárias. Depois da cena, do caderno no chão, vê-se o Donnie usando os abafadores.Sozinho, sem os amigos.

Em relação ao que o diretor e ator andam dizendo, sinto muito. Existe uma coisa que se chama metalinguagem. O filme é muito direto em relação a isso. Até nas letras da trilha sonora. Então, pra mim, vale o que é mostrado, não o que o diretor fala.

Pela versão do diretor, pelas cenas originalmente gravadas e cortadas da versão original, conclui-se que ele propõe mesmo que o Donnie cometeu suicídio e que seria mesmo o filme uma explicação entre as causas e a visão que ele tinha dos fatos e das pessoas. E é bem constante a repetição de determinados gestos. São ora memórias, ora como ele gostaria que acontecesse.



Os bilhetes da geladeira são escritos por ele e a família os ignora. Ele volta pra casa no início(passa pelo carro do Frank) e ninguém repara que ele não dormiu fora, apesar do bilhete “Aonde está Donnie?”. A irmã dele entrega que ele não tem tomado os remédios pra se vingar, diz que não é nada demais. A mãe vai perguntar se ele foi jogar papel higiênico na casa dos vizinhos , como se ele não fizesse nada de grave, quando não toma os remédios e vai “dormir”.

Ele sofre de bullying na escola (ele se identifica com a Cherita). É repetente e não tem amigos. Isto, a gente sabe pela psiquiatra. Daí, concluir-se que os amigos dele no filme são imaginários. Na escola, que surgem a teoria das oposições: destruição x recriação (na aula, pouco antes de ele destruir a escola), amor x medo (teoria do JC, que revoluciona a forma das pessoas verem as coisas). A oposição principal, representada pelo Frank (que é o cara ”amaldiçoado,” que o pai do Donnie comenta com a mãe) X Donnie. Frank está morto. Em vários momentos, cita-se morte e busca por Deus.Ele pode visualizar como o namorado da irmã. Frank é como o pai dele fala, ou seja, filho do amaldiçoado.

A turbina do avião tem um simbolismo: remorso. Ela destrói a casa, que representa a família, logo, se vc considerar a existência da turbina, a morte seria presumida pela queda da turbina, o que absolviria os pais e a irmã pela negligência. Ele deu sinais, e a família os ignorou.

A teoria do universo paralelo, representada pela Roberta Sparrow, seria um mundo onde as coisas seriam diferentes , porque, pra ele, neste mundo (real) ele teria que morrer. Como se fosse importante e não houvesse escolha. O que ele diz à RS seria como uma carta de suicídio. Ela quem diz a ele que todas as criaturas morrem sozinhas. Seria como se ele fosse apenas dormir, e ir pro universo paralelo.

A cena em que a psiquiatra menciona sobre os placebos é uma metáfora.Placebos não têm efeitos medicinais, mas o cérebro acredita serem de verdade. É uma referência entre ser agnóstico e ateu. Realidade e ilusão.A fé é a forma como se faz o cérebro, que comanda o corpo, acreditar que pode acontecer.

Enfim, eu acho exatamente o contrário do que disseram: se você coloca o filme como sci fi, você o empobrece culturalmente. Existe toda uma linguagem e uma série de simbolismos que estão nas entrelinhas da história e isso inclui alguns personagens, além do filme e da literalidade visual.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Donnie Darko (2001)


É um filme que trata de esquizofrenia sob o ponto de vista do esquizofrênico. De como uma pessoa doente pode ter uma visão crítica muito mais sensata do que as pessoas "normais" e a filosofia da auto-ajuda, que deixa as pessoas cegas, passivas em relação àqueles que "podem" dizer o que se deve fazer. Desde médicos psiquiatras a filósofos da auto ajuda que são instrumentos modernos de dominação, com ápice na década de 80, quando se ambienta o filme.

Donnie cumpre pena alternativa por ter causado um incêndio. Ele foi diagnosticado como esquizofrênico, toma psicotrópicos e é tratado por uma psiquiatra liberal. O filme trata da forma como ele se vê , não como ele realmente é. E isto se deve ao fato da perda de controle sobre ele. Tanto dos medicamentos quanto das sessões com a psiquiatra. Donnie sofre de sonâmbulismos e consegue sair de casa. Na primeira cena, ele está voltando pra casa depois de dormir fora casa e é o dia em que os pais descobrem que ele não está tomando seus medicamentos e passam a aumentar o controle sobre ele. E , neste mesmo dia, ele passa a ter contato com Frank - um coelho gigante, que ele acredita ter vindo do futuro, que o convence praticar condutas que ele não deseja, mas que trarão benefícios para o seu futuro. E paralelamente a isso, ele busca fundamentos para a argumentação do Frank, do portal do tempo, da influência da "Filosofia de viajar no tempo" escrita por Gradma Death (vovó surda), cujo nome é Roberta Sparrow, Da mesma forma que o filme "De volta para o futuro".

Aliás, duas coisas a serem observadas : primeiro, a referência ao livro do Graham Greene (portador de esquizofrenia), numa aula, em que somente ele entende a lógica do livro, a motivação de um incêndio, onde crianças entram numa casa e queimam o dinheiro que acham no colchão. Provavelmente , a forma como ele cometeu o crime pelo qual cumpria pena e, também, quando falam da teoria do tempo, do Deloren, o professor de Física não o acompanha no raciocínio. Há também uma teoria dele a respeito dos smurfs. São coisas que ele vê, toma como óbvias, e as pessoas não entendem. O livro da filosofia do tempo é algo que ele queria ver, como se estivesse sendo compreendido.

No filme, ele escapa de um acidente. Uma turbina de avião cai exatamente em cima do seu quarto. Ele estava dormindo num campo de golfe, por causa de seu sonâmbulismo. A partir daí, ele descobre, por Frank, que faltam 28 dias para o fim do mundo. Chega um escritor, John Cunningham com uma filosofia do Medo x Amor, ele conhece Gretchen, uma aluna nova, que vive sob custódia do estado, em programa de proteção à testemunha (pós tentativa de assassinato da mãe pelo padrasto). Eles se apaixonam, e ele descobre que, em torno dela, há toda uma cadeia de acontecimentos e situações que só poderiam ser mudados se fosse possível mudar o tempo. É por isso que ele obedece ao Frank, por acreditar que está evitando o lado ruim dos fatos, como se ele fosse um instrumento de mudança e importante para as pessoas. E a gente vê, inclusive na cena em que ele afronta Cunningham, acusando-o de anticristo, recebendo aplausos dos colegas, de como ele se torna celebridade ao sobreviver ao acidente, dos amigos, pessoas que admiram sua inteligência e influência.

Após o tempo de 28 dias, começa-se a ver a visão "real" dos fatos. São apresentados todos os personagens, como ocorreu o acidente da turbina, e todo o filme é fruto de uma alucinação sua e, inclusive seus amigos, imaginários, da mesma forma que o Frank. Ele era uma pessoa sozinha, desconhecida, que fantasiava a respeito da própria realidade.

*Destaque pra trilha sonora: Echo and the Bunnymen, Tears for Fears, Duran Duran,  Michael Andrew e Gary Jules.